Acompanhava a Santa Vigília Pascal pela televisão, quando o Papa Francisco em sua homilia, faz-me esta pergunta que indaga-me sobre as
pedras com que me deparo no meu caminho…
Qual é a minha pedra a ser removida, como se chama esta pedra?
Não é uma pergunta que possa oferecer soluções, mas certamente
faz-nos confrontar e nomear as pedras que dizemos ter no nosso caminho.
“Muitas vezes, a esperança é obstruída pela pedra da falta
de confiança. Quando se dá espaço à ideia de que tudo corre mal e que sempre
vai de mal a pior, resignados, chegamos a crer que a morte seja mais forte que
a vida e tornamo-nos cínicos e sarcásticos, portadores dum desânimo doentio.
Pedra sobre pedra, construímos dentro de nós um monumento à insatisfação, o
sepulcro da esperança. Lamentando-nos da vida, tornamos a vida dependente das
lamentações e espiritualmente doente. Insinua-se, assim, uma espécie de
psicologia do sepulcro: tudo termina ali, sem esperança de sair vivo. Mas, eis
que surge a pergunta desafiadora da Páscoa: Porque buscais o Vivente entre os
mortos? O Senhor não habita na resignação. Ressuscitou, não está lá; não O
procures, onde nunca O encontrarás: não é Deus dos mortos, mas dos vivos (cf.
Mt 22, 32). Não sepultes a esperança!” (Homilia do Papa Francisco na Vigília
Pascal de 20 de abril de 2019)
Hoje quando abri a porta da minha casa à Visita Pascal e
beijei a cruz senti-me abençoada por tantas graças que recebi ao longo da minha
vida. Num segundo percebi que tantas e tantas vezes, julgava que tudo estava
prestes a acabar e, no entanto, eis a ressurreição, o túmulo vazio onde a morte
é vencida.
Nos últimos meses perdi pessoas muito queridas, amigas que
me acompanharam nos últimos tempos, pessoas que viveram uma vida cheia de lutas
e tantas pedras que quase as esmagaram.
“Ainda que atravesse vales tenebrosos, de nenhum mal terei
medo porque Tu estás comigo. A tua vara e o teu cajado dão-me confiança.” (Salmos 23,4)
A vida, por vezes nos confronta com a nossa fragilidade, de
que nada somos, e que por instante, ficamos sem nada, despidos de tudo que
julgávamos ter.
Quando Jesus foi crucificado, Ele estava ali, despido de
tudo, suas roupas foram divididas pelos soldados e o seu manto sorteado. No
calvário, Jesus mostra-nos o que somos quando a doença e a morte se aproxima.
“Os soldados, depois de terem crucificado Jesus, pegaram na
roupa dele e fizeram quatro partes, uma para cada soldado, excepto a túnica. A
túnica, toda tecida de uma só peça de alto a baixo, não tinha costuras. Então,
os soldados disseram uns aos outros: «Não a rasguemos; tiremo-la à sorte, para
ver a quem tocará.» Assim se cumpriu a Escritura, que diz: Repartiram entre
eles as minhas vestes e sobre a minha túnica lançaram sortes.” (João 19,23-24)
Este nada é o que a morte e a doença nos traz, quer tenhamos
muito ou pouco. Não existe distinção para os que têm muito, porque chegada esta
hora, temos de sair desta vida com as mãos vazias.
Porém, quando Maria Madalena vai ao sepulcro onde colocaram o corpo de Jesus, no terceiro
dia após a sua morte, eis que se depara com um túmulo vazio…
“No primeiro dia da semana, ao romper da alva, as mulheres
foram ao sepulcro, levando os perfumes que haviam preparado. Encontraram
removida a pedra da porta do sepulcro e, entrando, não acharam o corpo do
Senhor Jesus. Estando elas perplexas com o caso, apareceram-lhes dois homens em
trajes resplandecentes. Como estivessem amedrontadas e voltassem o rosto para o
chão, eles disseram-lhes: «Porque buscais o Vivente entre os mortos? Não está
aqui; ressuscitou! Lembrai-vos de como vos falou, quando ainda estava na
Galileia, dizendo que o Filho do Homem havia de ser entregue às mãos dos
pecadores, ser crucificado e ressuscitar ao terceiro dia.»”(Lucas 24, 1-7)
“Recordando Jesus, as mulheres deixam o sepulcro. A Páscoa
ensina-nos que o crente se detém pouco no cemitério, porque é chamado a
caminhar ao encontro do Vivente. Perguntemo-nos: na minha vida, para onde
caminho? Sucede às vezes que o nosso pensamento se dirija continua e
exclusivamente para os nossos problemas, que nunca faltam, e vamos ter com o
Senhor apenas para nos ajudar. Mas, deste modo, são as nossas necessidades que
nos orientam, não Jesus.” (Homilia do Papa Francisco na Vigília Pascal de 20 de
abril de 2019)
Por vezes, fixamos-nos nos problemas, naquilo que nos mói por
dentro…
Lembro-me de uma parte do filme da história de Santa Clara de Assis, quando a irmã
Cecília, que estava no convento com Santa Clara, retorna após mendigar por
comida … Só lhe deram bocados de pão duro para além das pedras que lhe atiraram
e dos insultos que recebeu por ir mendigar, sendo ela de família rica e ter
deixado tudo para ir para o convento. Enquanto a irmã Cecília chora e queixa-se da injustiça que
sofreu, Santa Clara está a lavar-lhe e limpar-lhe os pés com muito amor,
beijando-os ternamente. Por momentos, a irmã Cecília assusta-se por ver Santa Clara,
na altura, a sua madre superiora a beijar-lhe humildemente os pés, e depois
deste ato bíblico, a exemplo de Jesus, toda a queixa esgota-se…
Este momento do filme pode-se ver no minuto 29.21 do filme
em
Esta parte do filme faz-me interrogar onde
está a minha fé e esperança em Deus, se a cada pedra que me atiram, deixo-me
curvar ou queixo-me amargamente?
Aconselho que vejam não só esta parte mas todo este filme sobre a santa Clara de Assis que nos propõe, que a vida em seu "tudo" ou em seu "nada" diante do nosso amor a Deus, especialmente quando se ama a Deus nos que nos estão próximos, o "nada" e o "tudo" ficam apenas dependente desse amor.
Jesus Ressuscitou e as pedras que me sepultam precisam ser retiradas, especialmente as que me podem matar para sempre:
“A Páscoa, irmãos e irmãs, é a festa da remoção das pedras. Deus
remove as pedras mais duras, contra as quais vão embater esperanças e
expetativas: a morte, o pecado, o medo, o mundanismo. A história humana não acaba frente a uma pedra
sepulcral, já que hoje mesmo descobre a «pedra viva» (cf. 1 Ped 2, 4): Jesus
ressuscitado.” (Homilia do Papa Francisco na Vigília Pascal de 20 de abril de
2019)
Homilia do Papa Francisco na Vigília Pascal de 20/04/2019:
As passagens bíblicas foram retiradas do site:
capuchinhos.org/
Texto e fotos de autoria de Rosária Grácio
Pinturas de Gráccio Caetano
www.gracciocaetano.com
gracciocaetano.blogspot.pt