domingo, 5 de março de 2017

“Felizes os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados.”



“Felizes os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados.” (Mateus 5, 6)

O que é "justiça"?

Segundo o vocabulário da língua portuguesa, justiça significa “virtude moral que inspira o respeito pelos direitos de cada pessoa e a atribuição do que é devido a cada um; equidade”.

A palavra “equidade” é uma palavra muito usada em direito civil. A “equidade” é sinónimo de imparcialidade, igualdade, justiça

Justitia est constans et perpetua voluntas jus suum cuique tribuendi”, ou seja, a "justiça é a constante e perpétua vontade de dar a cada um o que lhe é devido".

Ter uma “constante e perpétua vontade” quer dizer que não pode haver a justiça nos corações dos que são instáveis em sua vontade.

A justiça deve ser e é sempre a mesma ao longo da história e do tempo.



“ A justiça é a virtude moral que consiste na constante e firme vontade de dar a Deus e ao próximo o que lhes é devido. A justiça para com Deus chama-se «virtude da religião». Para com os homens, a justiça leva a respeitar os direitos de cada qual e a estabelecer, nas relações humanas, a harmonia que promove a equidade em relação às pessoas e ao bem comum. O homem justo, tantas vezes evocado nos livros santos, distingue-se pela rectidão habitual dos seus pensamentos e da sua conduta para com o próximo. «Não cometerás injustiças nos julgamentos. Não favorecerás o pobre, nem serás complacente para com os poderosos. Julgarás o teu próximo com imparcialidade» (Lv 19, 15). «Senhores, dai aos vossos escravos o que é justo e equitativo, considerando que também vós tendes um Senhor no céu»(Cl 4, 1).” (Catecismo da Igreja Católica nº 1807)

Quão difícil é interpretar esta “justiça moral” no nosso tempo! 

Aliás, mais ainda difícil, esclarecer com a história humana, o que é a justiça.

As leis humanas moldam-se e mudam-se consoante os tempos e as vontades.

Por isso, a justiça humana foi e é frágil e quebrou-se fácil ao longo da história.

Porquê a justiça humana mostra-se assim?


Humanamente somos imperfeitos. Buscamos a perfeição, mas somos todos, de alguma maneira imperfeitos.

E para além disso, a razão humana está em constante aprendizagem com a experiência ao longo do tempo. E ainda temos de colocar o peso dos desejos e dos conceitos que vão se apresentando na construção das sociedades humanas.

Porém Jesus fala-me da “fome e sede de justiça” que deve haver para que realmente haja a justiça.

Ter “fome e sede de Justiça” é ter uma vontade intrínseca de buscar a justiça em tudo, seja pequeno ou grande, rico ou pobre, são ou doente, perfeito ou imperfeito…

Todos e tudo devem estar mergulhados em justiça.

E a “fome e sede de justiça” inunda os corações dos que amam a Deus.

Segundo a Igreja Católica, a justiça é considerada uma das virtudes cardeais:

Há quatro virtudes que desempenham um papel de charneira. Por isso, se chamam «cardeais»; todas as outras se agrupam em torno delas. São: a prudência, a justiça, a fortaleza e a temperança. «Se alguém ama a justiça, o fruto dos seus trabalhos são as virtudes, porque ela ensina a temperança e a prudência, a justiça e a fortaleza» (Sb 8, 7). Com estes ou outros nomes, estas virtudes são louvadas em numerosas passagens da Sagrada Escritura.” (Catecismo da Igreja Católica nº 1805)

Jesus promete que todos os que ansiarem de pleno coração pela justiça, serão felizes porque serão saciados.

Na nossa sociedade, esta promessa parece-me utópica…

Quantas e quantas pessoas perseguem o que é justo e morrem, por vezes, sem conhecer a justiça em sua vida.

Muitos dizem que não há justiça na terra enquanto houver tantas disparidades sociais, onde alguns têm direito a tudo e outros a quase nada.

Mas é aí que Jesus nos toca a ferida…

Afinal, qual é a minha "justiça"? Qual é a minha vontade de justiça que julgo ser a "justiça"?

Falar de bens que uns têm e outros não, é exatamente a justiça humana falível que tanto se veste e despe de valores e medidas ao longo do tempo. Sim, porque se vou medir a justiça com coisas materiais que uns têm e outros não, acabo por minar a justiça.

A verdadeira justiça não é um conceito, mas um valor moral que deve estar dentro da pessoa humana. E este valor não pode se agarrar às modas de cada tempo.

Jesus dá-me uma pista do que é a verdadeira justiça:
"Procurai primeiro o Reino de Deus e a sua justiça, e tudo o mais se vos dará por acréscimo". (São Mateus 6, 33)


A justiça de Jesus está em buscar primeiramente o Reino e Deus e depois todo o resto virá por acréscimo.

O Reino de Deus que Jesus viveu e pregou em sua vida está presente desde a Manjedoura do seu nascimento até a cruz da sua morte. Humanamente, a vida de Jesus foi injusta. Porém, Jesus abre uma porta de esperança com a sua Ressurreição. Ele diz-me que a justiça humana é muito pequenina diante da justiça de Deus e que esta é por vezes, incompreensível aos meus olhos humanos.

Jesus ressuscitado é a vitória da verdadeira justiça.

Jesus olha-me nos olhos e diz-me para ver a sua vida, e ali ver o que é a justiça.

Jesus sempre teve muita "fome e a sede de justiça". Nem a morte acabou com esta sua vontade de realizar a justiça entre nós.

E o que Jesus fez, apenas o fez porque Ele conhecia o Pai e a sua infinita misericórdia.



É nesta misericórdia de Deus que o Papa Francisco ensina-me sobre a verdadeira justiça.

Na Audiência Geral de 3 de Fevereiro de 2016, o Papa Francisco fala-me que uma verdadeira justiça está dependente do perdão e da misericórdia: “Certamente, é um caminho difícil. Requer que quem recebeu a ofensa esteja pronto a perdoar e deseje a salvação e o bem de quem o ofendeu. Mas só assim a justiça pode triunfar, porque se o culpado reconhecer o mal praticado e deixar de o fazer, eis que o mal já não existe, e aquele que era injusto torna-se justo, porque foi perdoado e ajudado a reencontrar a via do bem. E isto tem a ver precisamente com o perdão, com a misericórdia.

Esta justiça baseada na misericórdia é complicada de se realizar enquanto as sociedades humanas acharem que ao condenar, estão a fazer justiça.

Dar ao injusto uma condenação sem mostrar-lhe qualquer valor moral é mais fácil, mas ineficaz.

Talvez, por causa disso, ainda as sociedades humanas continuem sedentas e esfomeadas de justiça, apesar de tantos códigos e leis que as inundam sem, contudo, sacia-las, tornando-as infelizes.  


Bibliografia:

A frase em latim e sua tradução foi retirada do Breviário de Latim/Português – Virgílio Queirós e Sofia Miranda – Quid Juris Sociedade Editora

Versículos bíblicos consultados em http://www.capuchinhos.org/biblia/

A Audiência do papa Francisco de 03/02/016 foi consultada em
http://w2.vatican.va/content/francesco/pt/audiences/2016/documents/papa-francesco_20160203_udienza-generale.html

O Significado da palavra “justiça” foi consultado em
justiça in Dicionário infopédia da Língua Portuguesa com Acordo Ortográfico [em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2017. [consult. 2017-02-26 18:59:42]. Disponível na Internet: https://www.infopedia.pt/dicionarios/lingua-portuguesa/justiça

Imagens - obras originais de Rosária Vilela intituladas:
"Justiça" - óleo sobre tela 
"Nossa Senhora da Piedade" - óleo sobre tela 
"Sagrado Coração de Jesus" - tinta acrílica sobre tela


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